O que é Geofísica?

Quando olhamos para a etimologia,  Geofísica seria a ciência que estuda a física da Terra. Por outro viés, seria a ciência que se utiliza de métodos físicos no intuito de se conhecer determinadas propriedades físicas da Terra, em sua maioria são métodos indiretos, não-invasivos. Todavia, esses conceitos hoje em dia não se limitam apenas ao estudo do planeta Terra, mas também engloba estudos da Lua, assim como outros planetas e outras luas. Em termos mais simplórios, geofísicos são como médicos. Médicos da Terra. Imagine a Terra como um paciente, e o geofísico como um médico. Assim como há médico clínico geral, há médicos especializados em cada parte do corpo humano.

Um paciente a ser atendido pelo clínico geral, normalmente, espera-se que o clínico geral faça exames iniciais simples: conversa (estudo do caso), análise das respostas motoras, aferição de pressão etc. Por analogia, quando um prospector solicita o auxílio do geofísico em determinado contexto geológico, tem-se a conversa solicitando o que o prospector deseja descobrir com a geofísica e assim verificar a viabilidade, faz-se o estudo breve  da área de estudo e verifica-se se há trabalhos prévios realizados ali, e claro, uma boa conversa e uma análise minunciosa da situação é essencial para os objetivos do trabalho. Isso porque a geofísica segue uma premissa imprescindível: contraste de propriedade física. Se não houver contraste de propriedade suficientemente detectável, a geofísica não irá resolver problema algum. Antes de toda e qualquer execução de levantamento geofísico (etapa de ir ao local e realizar a aquisição das propriedades) é preciso realizar teste de viabilidade.

Suponha que o paciente seja uma criança que caiu e bateu a cabeça no chão, além de sentir dores na mão. Após etapas iniciais com o paciente e o responsável, o clínico geral solicita imagens de tomografia e ressonância magnética  da mão, do braço e da cabeça da criança. O radiologista realiza os exames na criança e encaminha os resultados ao clínico geral. Ao receber os resultados o clínico geral percebe que na imagem da mão, uma das falanges proximal  sofreu luxação e precisa ser remediada. Enquanto que na imagem da cabeça apareceu uma estrutura que parece um coágulo, e que precisa de uma imagem de detalhe. Na geofísica é semelhante. Numa determinada área da Terra, numa área delimitada na Formação Serra Geral por exemplo ( uma das características geológicas no Estado do Paraná), possui rocha que pode estar com fratura e nessa fratura pode estar preenchida com água, e o prospector deseja saber o local exato que ele poderia fazer um poço para captação de água. O geofísico após as etapas iniciais de viabilidade executa o levantamento. Nesse contexto, ele pode buscar por uma propriedade física específica, resistividade ou condutividade, outras propriedades poderiam ser selecionadas a fim de reduzir a ambiguidade das respostas. Nesse caso, o geofísico espera que o basalto apresente-se resistivo, enquanto a fratura possivelmente saturada por água apresente-se condutora. Porém não necessariamente aquilo que é visto na imagem como condutor é uma fratura saturada por água, poderia simplesmente ser argilas, nesse ponto que a experiência e conhecimentos de geologia e interpretação  do geofísico não podem dar margem a equívocos. 

Da mesma forma que o clínico geral interpretou a luxação na mão da criança e precisou remediar, o geofísico elabora um relatório técnico ao prospector contratante acerca da área de maior potencial. Já no caso das imagens da cabeça da criança, o médico suspeitou que fosse um coágulo e solicitou novas imagens de detalhe, porque não é simplesmente por haver uma suspeita que já deveria abrir a cabeça da criança e fazer a cirurgia. Assim também funciona com o geofísico. Se houver necessidade de um levantamento de maior detalhe a fim de reduzir a ambiguidade de interpretação, assim o deve ser feito. Talvez recorrendo a outras propriedades físicas a serem investigadas com outros métodos, assim como outras técnicas.

No geral, quase todos os tipos de exames que os médicos realizam no corpo humano, os geofísicos também realizam com a Terra. Há uma similaridade muito grande. Assim como na medicina há o método de ultrassonografia que permite a visualização da criança dentro da barriga da mãe, sem a necessidade de abrir a barriga e ver como a criança está. Na geofísica são utilizados métodos não-invasivos que podem fornecer a imagem do alvo de interesse. Como é o caso do GPR ( radar de penetração do solo) e métodos sísmicos. Da mesma forma que na medicina utilizam-se eletrodos para realizar exames de eletrocardiograma ou eletroencefalograma, na geofísica também temos os métodos elétricos e eletromagnéticos. Em suma, os princípios físicos utilizados na medicina são os mesmos princípios utilizados na geofísica, a grande diferença é o paciente.

Mas o que tem a ver o geólogo com o geofísico? Tudo a ver! Geólogos e geofísicos DEVEM andar juntos. A geofísica sem conhecimentos geológicos muitas vezes podem não dizer nada consistente com a realidade. A geofísica se baseia em modelos que tenham consistência matemática e ao mesmo tempo consistência geológica. Assim, a parceria geólogo e geofísico é essencial para um projeto com sucesso. 

O geólogo sente a necessidade de "ter em mãos" os objetos de estudos, porém nem sempre há possibilidade de tê-los em  mãos, e isso é capaz de deixar o geólogo "cego" na pesquisa. Logo, o geofísico é acionado para guiar o geólogo. 

Relembrando o caso da criança que bateu a cabeça no chão, o clínico geral pediu a imagem de detalhe, contudo a imagem de detalhe apontou não apenas um provável coágulo, mas vários nódulos. Logo o clínico geral encaminha a criança para um neurologista. O neurologista solicita uma biópsia porque suspeita que seja um tumor malígno, mas precisa ter certeza. Feito a biópsia, leva a amostra para o Bioquímico, e  confirma que é um tumor malígno. O neurologista não vê outra alternativa além da cirurgia imediata. Pega as imagens da cabeça da criança e seleciona os lugares que teriam grande risco à vida da criança e planeja a cirurgia. Realizada a cirurgia, dá-se a notícia de sucesso aos familiares, além de contar o real motivo da queda da criança ( o tumor sendo a causa) e também o porquê de o tumor ter crescido na cabeça da criança (herança genética), logo seria aconselhável exames preventivos nos familiares.

Não raramente, geólogos também solicitam biópsias (furos de sondagem), muitas vezes a partir das imagens fornecidas pelos geofísicos. Com as amostras do furo de sondagem são feitos as observações visuais, assim como as análises geoquímicas. A partir de então o geoquímico, o geofísico e o geólogo interpretam que os resultados indicam uma área potencial para exploração de ouro por exemplo. Assim são capazes de contar a história de como o depósito de ouro foi formado, podem inferir o tamanho do depósito, quantos anos de exploração, a profundidade etc.

A aplicabilidade da geofísica é enorme. Geólogos, geoquímicos e geofísicos devem sempre andar juntos nas pesquisas, outros profissionais também. A interdisciplinaridade e integração reduzem consideravelmente as ambiguidades de interpretação. Quanto mais informações, melhor. Furos de sondagens  muitas vezes não são tão baratos nem viáveis, e não se pode sair furando em qualquer lugar. Portanto, é indispensável o trabalho do geofísico na seleção de áreas potenciais.

O geofísico deve ser um profissional que deve saber trabalhar em grupo. Deve buscar ter bons conhecimentos de geologia,  programação computacional, inglês, e sem dúvida: física e matemática. Não significa que o geofísico tenha que  ser um gênio, mas que seja um indivíduo que não tenha medo de aprender e buscar novos desafios. 

A profissão é de ciclos. Ora tem ciclo das vacas gordas, ora das vacas magras. Assim como a maioria das profissões. Pode parecer que no tempo das vacas magras não haja espaço para geofísicos no mercado de trabalho, mas sempre há espaço. A aplicabilidade é enorme. O grande problema é que a grande absorção de geofísicos no mercado é na indústria do petróleo, e quando o setor do petróleo vai mal, a geofísica do petróleo também vai mal.

Por isso não é aconselhável escolher uma profissão simplesmente por conta do salário. É preciso ter algo mais além de "quanto vou ganhar?".  

O geofísico pode ser um geofísico mais "prático" e/ou um geofísico mais "teórico", e isso depende muito mais do interesse desenvolvido durante a faculdade. Porém, é essencial  saber andar nas duas áreas, além de ter em mente que viagens constantes fazem parte da agenda. O que pode ser excelente, mas também cansativo. Não são viagens de férias, porém, é prazeroso.

Assim como ocorre com as outras ciências, a geofísica  se divide   na Geofísica Pura e na Geofísica Aplicada.

A Geofísica Pura, também conhecida como geofísica global, relaciona-se ao estudo da gravidade, magnetismo, eletricidade e sismologia, mas também compreende os estudos  de vulcanologia, geodinâmica, climatologia, oceanografia e outras ciências relacionadas com a física da Terra, trata-se de estudo mais abrangente, muitas vezes são estudos muito mais teóricos, com desenvolvimento de métodos, fórmulas etc.

A Geofísica Aplicada, é a ciência que trata da aplicação da Geofísica Pura, também conhecida como Geofísica de Prospecção. Em geral, quando se aplica as ciências físicas ao estudo da parte mais superficial da crosta terrestre, de modo que possa ser explorada pelo homem, tem-se a Geofísica de Prospecção.




Oziel Araújo
Oziel Araújo, geofísico pela Universidade Federal do Pampa, 
mestre em Geologia pela Universidade Federal do Paraná.

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